sábado, 5 de março de 2011

Killzone 3: tiroteio de gente grande com nazistas espaciais e sotaque brasileiro

Killzone 3: tiroteio de gente grande com nazistas espaciais e sotaque brasileiro

Na sua carreira de jogador, você deve ter ouvido muitas vezes o termo “Halo-Killer”. Aquele jogo que destronaria a saga de Master Chief como a preferida de quem dava seus pipocos nos consoles – e não no computador. Killzone, lançado para PS2 em 2004, foi um dos originais, um dos pioneiros na aposta de que alguém poderia ser o novo campeão. Não podemos dizer que ele teve muito sucesso nessa empreitada específica, mas o esforço da Guerrilla games não foi em vão. A produtora criou uma marca forte para acompanhar a família PlayStation e um game de tiro bom. E, mais importante, com identidade própria, sem depender da sombra dos fuzileiros navais espaciais.

Mas devo dizer que falhei miseravelmente na tarefa de gostar muito de Killzone 2, lançado para PS3 em 2009. E eu queria. Digo “queria” porque, como muitos que eu conheço, acabei dispensando o jogo como se ele fosse qualquer outro shooter genérico. Mas quando comecei (continuei?) a aventura de Sev e dos soldados da ISA em Killzone 3, encontrei uma experiência surpreendentemente interessante.

Não pela história, que é bem normal, repete a velha fórmula dos bonzinhos espaciais contra os nazistas espaciais (até literalmente demais, com iconografias, roupas e imagens quase copiadas da Segunda Guerra), e não traz nada de novo em absoluto. Mas aqui já temos um contraponto interessante com Halo: enquanto a série da Bungie tem uma premissa boa com personagens péssimos (com exeção do Árbitro) Killzone faz o contrário. Sevchenko é gente boa o suficiente para que você goste dele, Rico é camarada o suficiente para que você goste dele, e o Capitão Narville é caxias o suficiente para que você cultive uma certa raiva. Tudo certo, tudo em ordem.

Uma guerra menos burra

Mas o verdadeiro mérito da série da Guerrilla é que ela é mais “orgânica” que as outras, mais real. Não é o realismo gráfico cinza-e-marrom de boa parte dos jogos da geração atual, mas um realismo de peso, de volume. Enquanto em outras séries as armas, os inimigos e objetos parecem feitos de isopor, falsos de doer, aqui a menor das pistolas é robusta, dá um coice bom de ouvir e dispara balas que fazem um Helghast balançar com o impacto.

A própria SS espacial tem um papel especial, por dois motivos. Primeiro, porque não são completos idiotas. Além de se posicionarem conscientemente, eles se escondem e atiram com uma precisão que, às vezes, é boa até demais. Não ficam parados, fora do murinho de pedra, esperando você superar sua inabilidade de mirar certo. Se você atirar errado, vai ter de se esconder e esperar outra oportunidade.

Segundo, porque talvez esse seja um dos únicos jogos de tiro em que os inimigos são tão resistentes quanto você. Claro, eles não contam com a magia da geleia de morango no rosto para se recuperarem em alguns segundos, mas mesmo assim é preciso uns bons cinco ou seis tiros no corpo e uns dois na cabeça para derrubar um soldado de Helghan. Além de causar uma tensão maior, isso também faz com que você tenha de se posicionar melhor para conseguir atirar o máximo possível sem sofrer muito com os contra-ataques. São tiroteios definitivamente diferentes de qualquer outro jogo do gênero, e isso é ótimo.

Mas se Killzone 2 já tinha tudo isso de bom, por que eu não consegui gostar muito do jogo? Por que o esquema de controles era ruim e o seu multiplayer era um pesadelo logístico. E tudo isso foi resolvido em Killzone 3.

O primeiro problema era o mais fácil de resolver: bastava tirar a mira de precisão do clique do direcional analógico direito e passar para um dos Rs ou Ls, como faz todo outro shooter que se preze. Colocar esse comando no “R3″ talvez funcione em um jogo como Halo, que não exige tanto uma mira precisaa. Mas em Killzone, com a necessidade maior de “headshots”, a última coisa que você quer é ficar clicando e desclicando a alavanca. Então agora você tem opções de controles, e pode até voltar o zoom para a alavanca direita, se assim achar necessário.

O segundo problema exigia um pouco mais da Guerrilla Games, que se provou competente mais uma vez. No multiplayer da versão anterior, as classes iam sendo abertas com o seu progresso. Isso quer dizer que se você quisesse jogar de médico, sorte sua, por que era a primeira a aparecer. Mas a primeira habilidade de Engenheiro, para não citar as outras, só apareceria muitos níveis e horas de batalha depois.

A filosofia multiplayer

Você pode argumentar que é uma boa ideia fazer o jogador experimentar um pouco de cada classe até alcançar o que quer. Mas eu, por exemplo, simplesmente não conseguiria ganhar pontos de experiência como Franco-Atirador e, apesar de gostar de atuar como suporte no campo, tive minha paciência tostada na chapa antes de poder construir minha primeira Sentinela, que era o que eu queria desde o começo.

Agora tudo vem aberto logo de cara. Cada uma das cinco classes vem com uma arma primária e uma habilidade básica para você ir se aclimatando. Quer mais? Jogue, ganhe pontos (um nível) e use para desbloquear o que quiser – seja uma metralhadora mais forte, arma de cura com mais alcance ou só uma pistola para que você possa trocar – na ordem que quiser. A experiência fica muito mais personalizada, e então você se sente em casa, sem pressões desnecessárias.

Killzone 2 já tinha algo extremamente interessante no modo multiplayer, que era o modo Warzone (ou “Zona de Guerra”, para quem joga em português brasileiro). Nele os dois times se enfrentam em objetivos aleatórios durante 30 minutos, e “quem fizer mais pontos ganha”. Essas missões variam entre mata-mata, o tradicional Capture the Flag, defesa de bases e coisas do tipo, e já davam uma boa variedade aos confrontos online. Pois esse modo voltou, e trouxe com ele o Operations, que foi outra sacada excelente da Guerrilla.

Essa modalidade coloca os dois times como se estivessem se enfrentando em uma fase da campanha, com historinha e tudo. Cada mapa tem um objetivo específico, dividido em várias partes. Se você for ISA, ganha se conquistar tudo. Se for Helghast, ganha se defender tudo. É um bom jeito de se distanciar do que os outros FPS trazem normalmente, e funciona com perfeição.

A integração online do jogo só peca um pouco na personalização. É possível configurar qual é o seu mapa preferido para cada modo, e só. Não existe nenhum outro filtro a não ser o de região da PSN. Nesse aspecto, Halo Reach ainda é o campeão disparado.

Para sempre sozinho

Mas nem só de alegria e de “ownagem de noobs” vive Killzone 3. Um dos maiores pecados do jogo está justamente em uma das promessas mais alardeadas: poder jogar a história com um amigo. Qual não foi minha decepção quando descobri, em nossa visita à Sony, que o modo cooperativo era apenas local. Sem online. Só com outro controle no mesmo local. E nada de caminhos separados: o segundo jogador é uma mera “sombra” de Sev, que o acompanha onde ele vai e faz o que ele faz.

Left 4 2 Dead tem campanha co-op online. Halo: Reach tem campanha co-op online. Borderlands tem campanha co-op online. Gears of War 3, mesmo mudando a perspectiva de visão, terá campanha co-op online. Percebeu um padrão? Em 2011, com a jogatina online a todo gás, você não tem desculpa para fazer isso no seu jogo. Sendo assim, Killzone se sairia melhor se ficasse sem campanha cooperativa nenhuma.

Mas o que irrita, irrita mesmo, é o final do jogo. Porque ele é ruim, principalmente em contraste com todas as missões ótimas que o precedem. Existem batalhas a pé, em tanques, em robôs, em naves, de tiroteio, de furtividade, em cidades e em florestas. Batalhas que exigem paciência e planejamento, e batalhas que exigem dedo no gatilho sem piedade. Cenários de todas as cores, temas e complexidades. Tudo nos conformes, para no final o jogo cortar do clímax da conclusão da história direto para os créditos, depois para um epílogo sem graça, e depois para mais créditos.

Vale lembrar também que o esforço para situar os novatos é zero. A campanha começa minutos depois do fim de Killzone 2, e [SPOILERS SPOILER SPOILERS] se você não sabe porque Rico não poderia ter matado Scolar Visari, o problema é seu, champs.

Mas e a edição nacional, que inclui um código para baixar o tema estático que você vê abaixo? Vale a pena? Vale.

Killzone 3 BR

Você, leitor atento do Kotaku BR, leu as nossas críticas à dublagem nacional, e elas se mantêm. A maior parte dos atores não sabe atuar, a entonação raramente condiz com a cena, e o texto, às vezes, parece que foi traduzido no Babelfish. Em um momento, Rico diz “consegui”, quando queria dizer “entendi” – isso porque em inglês, “got it” quer dizer as duas coisas, dependendo do contexto. E não são poucos os “abaixem-se” e “tomem cuidado”, mesmo quando só há uma pessoa escutando. Falas bem encaixadas, como um “Boa!” depois de um tiro certo do camarada, convivem com outras vergonhosas, como um “Sim!” ao conseguir evitar um desastre com um blindado.

Ainda assim, é legal ouvir tudo em português, e os palavrões dão um toque especial. Não porque todo mundo que joga videogame tem 12 anos e dá risadinhas quando ouve um “p*ta que pariu”, mas porque xingar as mães imaginárias dos Helghast faz sentido, é um elemento natural nessa guerra. E se existe algo em falta nos games, são diálogos naturais. Em Killzone 3, tanto o idioma quanto o linguajar trazem o jogo mais perto de nós, e esse é o tipo de coisa que você só valoriza quando experimenta por conta própria.

Ter jogos dublados em português não é novidade. Os Halos nacionais o são desde o terceiro episódio, StarCraft II também, e até WarCraft II – aquele, lá de trás – tinha vozes brasileiras. Mas o trabalho de localização da Guerilla não foi bom, ficou abaixo da média. Se no futuro [Uncharted 3? oi] a Sony brasileira puder se envolver mais no projeto, acho que só temos a ganhar.

No fim das contas, Killzone pode não ter conseguido matar nenhum Halo, mas virou FPS de gente grande. O terceiro episódio tem problemas, mas não fica devendo nada para fuzileiros especiais e mercenários americanos.





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